Ela é um dos mais isolados e belos redutos naturais do mundo com suas montanhas, campos e cidades peculiares. Conheça a Patagônia Sul
Adaptado da reportagem que fiz para a Revista Viajar pelo Mundo – ed.23
O nome é igual, mas o cenário, bem diverso. Se você acha que não precisa ir à Patagônia chilena porque já conhece a parte argentina, está equivocado. Ambas têm mais diferenças que similaridades. E mais: dentro do próprio Chile, ela se divide em Patagônia Norte e Patagônia Sul – também diferentes.
Começo esta parte do Especial Chile com a mais conhecida: a Patagônia Sul. Ali, em vez das estepes a perder de vista do lado argentino, despontam montanhas, fiordes (os braços de mar que adentram a terra por vales estreitos), geleiras e fazendas.
Patagônia Sul – Ela é a região mais remota do continente sul-americano. Um lugar onde animais raros vivem em função da Cordilheira dos Andes e dos mais impressionantes glaciares do mundo.
O distanciamento geográfico, no entanto, não impediu que essa região se tornasse um dos principais destinos turísticos do Chile. Desde o século 19, navios que trafegavam do Oceano Atlântico para o Pacífico sempre passaram por ela, sobretudo antes da construção do Canal do Panamá, em 1914.
Dessa forma, enriqueceram-se as poucas cidades portuárias e surgiram muitas fazendas de criação de ovelhas, conduzidas por imigrantes, na maior parte alemães. Quando essas atividades perderam o fôlego, na segunda metade do século 20, o turismo entrou com força em seu lugar.
Torres del Paine – O centro das atenções de quem viaja para lá é, indiscutivelmente, o Parque Nacional Torres Del Paine. Declarado reserva da Biosfera pela Unesco, em 2009, ele foi eleito o 6º lugar mais bonito do mundo e o mais belo da América do Sul numa enquete realizada com 400 jornalistas de turismo.
A razão está no cenário incomum, que parece tirado de um quadro surrealista. Torres del Paine abriga glaciares, lagos e formações montanhosas raras, com mais de 3 mil metros de altitude, em alguns casos.
Não são simplesmente picos nevados, como se vê na Cordilheira dos Andes. No Paine, um fenômeno geológico exclusivo coloriu as rochas de uma forma que não se vê no resto do planeta. A lava vulcânica que subiu das camadas internas da Terra há 12 milhões de anos não conseguiu transpassar as rochas da superfície e acabou empurrando-as para o alto gradualmente.
Assim, em lugar dos vulcões (tão comuns no Chile), o que existe ali são picos agudos, com forma e cor muito incomuns. Cada camada de montanha tem uma tonalidade diferente, conforme a época em que surgiu, indo do preto ao laranja. Isso tudo permeado por bosques e lagos.
Hotéis inimagináveis – Quem vai ao parque tem a opção de apreciar a paisagem a partir dos vários hotéis e lodges ali instalados. O mais conhecido, o Explora, foi inaugurado nos anos 90 e desde então virou referência para quem busca hospedagem confortável, mas sem excessos e totalmente voltada para a contemplação da natureza.
O Explora não tem salas de jogos, discotecas ou um restaurante muito luxuoso, em contrapartida, sobram atividades como safáris fotográficos, navegações pelos agitados rios patagônicos e caminhadas monitoradas.
Sistema semelhante tem o novíssimo Tierra Patagonia. De frente para o Lago Sarmiento, ele é um convite à contemplação, com todos os seus quartos voltados às paisagens da região.
O Tierra Patagonia tem um spa caprichado e até mesmo jacuzzis externas, em meio à natureza. Mas que ninguém se engane: a ideia ali não é ficar nas suas dependências, e sim aproveitar as excursões oferecidas, que podem ser a pé, a cavalo, de van ou jipe.
Para os aventureiros – As excursões levam aos prodígios naturais do parque. O maior deles é o Paine Grande, com 3.050 metros de altitude. Apesar de não sertão alto (o monte Aconcágua, por exemplo, tem mais do que o dobro), ele é tão difícil de escalar que até hoje seu cume foi visitado por menos de 15 pessoas.
Ao seu lado, estão as “Torres” propriamente ditas. Elas formam um conjunto de montanhas de granito que contrasta com as outras formações célebres da região, os Cuernos – picos tortuosos, na forma de chifres, moldados pelo movimento das geleiras em épocas imemoriais. As cores impressionam, variando conforme a altura, do rosa ao preto.
Em Torres Del Paine, as montanhas seduzem. Mas elas não estão sozinhas. Animais simpáticos como os guanacos (um primo da lhama) fazem a alegria das crianças e dos que curtem fotografar. Outros dão mais trabalho para quem quer vê-los, como os pumas e condores – pássaro símbolo dos Andes. Seja como for, ninguém sai sem uma boa imagem na câmera.
As cidades da Patagônia – Há mais do que o Parque Torres Del Paine na Patagônia chilena. Duas cidades e seus arredores merecem uma visita. A primeira é a pequena Puerto Natales, distante 150 quilômetros do parque.
Com apenas 20 mil habitantes e 100 anos de idade, este antigo centro produtor de carne de carneiro e lã tem cassino, um museu caprichado sobre a herança indígena do sul do Chile, muitas lojinhas de artesanato e hotéis de estirpe.
Um deles, inaugurado em 2011, ocupa as antigas instalações de um frigorífico. Sim, é isso mesmo. O luxuoso The Singular Patagonia foi construído dentro do Puerto Bories, um gigantesco prédio de 1915, declarado Monumento Histórico Nacional pelo governo do Chile.
Com 56 apartamentos, spa, bar e restaurante de primeira linha, ele inclui, claro, um museu privado com máquinas do começo do século passado. Também apresenta aos que por ali se instalam um menu de 20 expedições exclusivas, que combinam caminhadas e navegações aos fiordes e aos incríveis glaciares Balmaceda e Serrano –distantes uma hora de barco.
Gastronomia singular – A sofisticação de Puerto Natales aparece também nos restaurantes. O Angélica’s, por exemplo, figura como “imperdível” nos guias de viagem chilenos, graças a sua proprietária, Angélica Muñoz – ex-chef de grandes resorts na África e no próprio Chile.
Quem vai a Puerto Natales, convém dizer, não pode deixar de explorar as fazendas centenárias da região, todas elas nos sopés dos Andes. Um exemplo é Porto Consuelo, comandada pelos netos do pioneiro Herman Eberhard, um dos primeiros produtores rurais da Patagonia chilena, no fim do século19.
Além dos rebanhos de ovelhas, o que lhes garante hoje a subsistência (e um bom lucro) são os almoços típicos oferecidos aos turistas. Eles também podem desvendar cânions e colinas a cavalo ou remar em caiaque pelo inspirador fiorde Eberhard.
Animais pré-históricos – Outro programa obrigatório é ir à Cova do Milodon, a 30 minutos de carro de Puerto Natales. Trata-se de uma gruta na base do Monte Benitez, com 200 metros de profundidade, 30 metros de altura e 80 metros de largura.
Nesse refúgio natural moraram durante milênios os milodons, uma espécie animal extinta que, segundo dizem os cientistas, lembrava um bicho-preguiça gigante, com mais de 3 metros. Até algumas décadas atrás, os fósseis desses mamíferos podiam ser achados às centenas, ao nível do solo. Ainda hoje, basta cavar um pouco para encontrar pelos e unhas, preservados há 10 mil anos.
A capital patagônica – Com 125.000 habitantes, Punta Arenas é a maior e mais desenvolvida cidade da Região de Magalhães e Antártica Chilena – nome oficial da província patagônica. É também a última escala dos aviões e navios que rumam à Antártica e o ponto de partida para quem deseja conhecer as insólitas colônias de pinguins de Seno Otway e Ilha Magdalena.
Por isso, nessa cidade se sente um clima mais agitado que em qualquer outro ponto da Patagônia chilena. A cada dia, milhares de turistas e aventureiros ali desembarcam, sem imaginar que vão encontrar uma área urbana tão repleta de monumentos e construções históricas.
Marcos do passado, como o Palácio Sarah Brown e o Hotel José Nogueira, foram tombados pelo patrimônio histórico chileno e transformados em restaurante e hotel cinco estrelas, respectivamente.
Um afago pata o paladar – Dezenas de restaurantes de todas as vertentes e preços fazem da capital um agradável destino para fãs da gastronomia apurada e da enologia.
Se a patagônia chilena é um isolado reduto natural, nada como terminar sua jornada selvagem degustando um salmão grelhado em manteiga de alcaparrado Puerto Viejo, considerado por muitos o melhor lugar para comer na província toda.
Ou, ainda, relaxando e se divertindo no mais moderno hotel do extremo sul do Chile, o Dreams. Erguido há três anos na antiga zona portuária, hoje renovada, ele prevalece no cenário a beira mar e enche os olhos com sua arquitetura arrojada. Tem 88 suítes espaçosas, spa, um restaurante de alta gastronomia, boate e o Dreams Casino, que lota aos fins de semana, com gente de todo mundo tentando ganhar nas mesas de carteado, roleta e caça-níqueis.
Hospedar-se por ali e curtir o que esse delicioso fim de mundo tem a oferecer serve tanto de inspiração para quem está chegando à Patagônia quanto de final glorioso para os que estão concluindo a jornada.
Crédito das fotos: Paulo Mancha / Divulgação- Hotéis / Wikicommons
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Confira as demais reportagens do Especial Chile:
- Especial Chile – 5: Santiago
- Especial Chile – 4: De carro nos Andes
- Especial Chile – 3: Portillo
- Especial Chile – 2: Travessia de Lagos
- Especial Chile – 1: Pucón
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2 comentários em “Especial Chile – 6: Patagônia Sul”