Um giro pela Provença– Parte 4 (final)

Nossa parada final no sudeste francês foi a milenar Avignon, a cidade que já foi sede da Igreja Católica e centro de poder na Europa!

TEXTO, VÍDEO (acima) E FOTOS: PAULO MANCHA

Avignon – a guardiã

Se você começa sua jornada na Provença por uma cidade grande (para os padrões franceses) como Marselha, convém terminá-la da mesma forma. E Avignon é perfeita para isso.

Nos números oficiais, nem parece realmente ampla: são apenas 100 mil habitantes. Mas, somando as cidades conurbadas, mais 500 mil pessoas vivem por ali.

Essa sensação de urbe agitada eu tive logo na chegada, ao encarar a congestionada via que, paulistano da gema que sou, apelidei de “Marginal”. Só que, neste caso, em vez do maltratado Tietê, estava o aprazível Rio Ródano (ou Rhone, em francês), com suas límpidas águas verde-azuladas.

Avignon é um lugar especial na história do mundo. Habitada desde a Antiguidade, tornou-se  uma espécie de subsede administrativa do Cristianismo na Idade Média. A ponto de ostentar uma universidade ali fundada pelo Papa Bonifácio VIII, em 1303.

Em 1309, tornou-se de fato sede da Igreja Católica, quando instabilidades políticas afligiam Roma e ameaçavam o papado. Sete papas residiram em Avignon entre 1309 e 1377, a começar por Clemente V e terminando com Gregório XI.

Dá então para imaginar a opulência e majestade que tomaram o lugar de assalto, deixando seus resquícios até os dias de hoje.

Todo o centro da cidade faz parte da lista de Patrimônios Mundiais da Humanidade, segundo a UNESCO, incluindo o Palais des Papes, onde viviam os pontífices naquele século de glórias para a Provença.

Tem mais: as muralhas erguidas pelos Papas para proteção da área urbana estão de pé até hoje, e em bom estado de conservação, o que transforma este recanto francês em um cenário de cinema. Só que real.

Confesso, caro leitor do Viajando por Esporte, que o único momento de toda a jornada de sete dias pela Provença em que quase bati o carro foi ao chegar em Avignon e perder completamente a atenção no trânsito da “Marginal”, enquanto me embasbacava com a muralha, com o verde brilhante do Ródano e com a formosa Ponte Saint Bénézet.

Os freios ABS do Yaris me salvaram do prejuízo e do vexame. E, desta forma, pude me recolher ao simpático bed & breakfast Le Limas, para o devido descanso noturno, antes de um dia todo explorando a “cidade dos papas”.

Eu disse “bed & breakfast”? Sim, e é importante frisar que há alternativas de hospedagem para todos os bolsos nos abundantes destinos turísticos provençais. E em Avignon, essa casa de família fica a alguns passos das principais atrações turísticas e serve o café-da-manhã mais farto que desfrutei em toda a minha jornada.

Por falar em comida, antes que eu me esqueça, não deixe de ir ao Restaurant Le 46, que tem esse nome por ficar no número 46 da rue de la Balance. Um dos restaurantes mais badalados de Avignon, e com preços pra lá de razoáveis. Sua especialidade são os entrecôtes e filés, mas também serve peixes e massas. Ambiente jovem, lotado e divertido.

Onde os papas fizeram história

Revigorado após uma boa noite de sono, parti para a conquista da cidadela. Ou, ao menos, de sua história. A atração preponderante é o suntuoso Palais des Papes, a enorme edificação gótica, com muros de 5 metros de espessura, erigida entre 1335 e 1364 para abrigar os santos padres líderes da Igreja Romana.

Mesmo depois da partida dos pontífices, no Século 14, ela sobreviveu, transformada ora em caserna (inclusive por Napoleão Bonaparte), ora em palácio e, mais recentemente, em museu e centro cultural.

Daria para escrever uma reportagem inteira somente sobre o Palácio dos Papas. Afinal, é o maior palácio gótico de toda a Europa, com 15.000 m² de espaço – quase três campos de futebol somados.

São 25 ambientes entre aposentos papais, salas de cerimonial, capelas, claustro, cozinhas e outras dependências, cada uma com suas histórias, seus objetos de arte e seus afrescos inestimáveis, sobretudo os do artista italiano Matteo Giovannetti.

Sem contar a loja de suvenires – repleta de livros – e os amplos espaços dedicados a mostras temporárias de arte contemporânea. Enfim, se você gosta de história, é um lugar para gastar o dia todo explorando, de preferência com os audioguias alugados na bilheteria (inclusive em português).

Avignon, contudo, não é só o Palácio dos Papas. Depois de uma manhã inteira nele, parti para outro ponto de interesse: a ponte sobre o rio Ródano, também conhecida como Pont d’Avignon ou Pont Saint Bénézet.

Ela foi construída entre 1171 e 1185, mas, depois de uma inundação em 1660, parte desabou. Hoje, restam quatro dos 22 arcos que a compunham inicialmente tinha.

A ponte é célebre por uma canção infantil (“Sur le pont d’Avignon”), pela sua arquitetura e pelo visual insuperável que oferece para quem a percorre. Pode-se apreciar o rio verdinho, os bosques da ilha de la Barthelasse a oeste e um portal e parte da muralha que envolve o centro histórico a leste a ao sul.

Em tempo: há um audioguia com versão em português para quem quiser conhecer toda a história da ponte e suas curiosidades. E também é possível comprar um ingresso único que dá acesso a ela e ao Palácio dos Papas.

Depois da ponte, saí sem destino pela cidade. Este é um lugar que respira arte: Avignon é palco anual de um dos mais importantes festivais de teatro do planeta. Isso desde 1947, quando essa iniciativa foi tomada para ajudar a levantar o moral da cidade, empobrecida durante a Segunda Guerra Mundial.

Deu certo. O que se vê hoje é um bastião de erudição, elegância e altivez. São mais de dez museus de estirpe, onde você acha desde um crânio de Tyrannosaurus rex até quadros de van Gogh.

Guarde nomes como Musée Calvet (inaugurado há 216 anos!) ou Collection Lambert (um dos principais museus de arte moderna da França).

Sem falar na Opera Grand Avignon, o exuberante prédio de 1825, que, na verdade, havia sido uma reivindicação de Moliére quase dois séculos antes.

Ela fica ao lado do Hôtel de Ville, o não menos belo prédio da prefeitura. Ambos enobrecem ainda mais a Place de l’Horloge – ou Praça do Relógio -, o coração pulsante de Avignon.

Foi ali, em um dos mais de 15 cafés com mesinhas espalhadas pelo largo que passei minhas últimas horas nesta jornada incrível. Pondo à prova acepipes sublimados no mais fidedigno dos azeites de oliva e me embevecendo com tintos e rosés provençais.

Ou simplesmente contemplando o frescor da tarde em uma paragem que, ao longo de 1500 anos, testemunhou tudo que de bom e mau que a vida abarca. Mas que soube preservar para o Século 21 somente as virtudes. Como quase tudo na Provença.


DICAS DO PARMESOLINO

Dirigindo pela Provença 

Cidade de Lourmarin

Cachorros como eu não podem alugar carro, mas humanos, sim (sinceramente, não entendo…)” A CNH brasileira é aceita nas locadoras e um cartão de crédito é pedido como garantia. “Uma vez nas ruas, fique de olho em alguns detalhes“:

  1. Vale a pena consultar o significado das placas de trânsito, pois muitas são diferentes das nossas. Veja este site: drive-france.com/faqs/french-road-signs
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  2. Há muitas rotatórias, nas cidades e nas estradas. A preferência é de quem já está dentro dela ou de quem chega primeiro. “E não de quem vem ‘mais rápido’, como no Brasil!”, alerta o cão-guarda-rodoviário…
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  3. Ao chegar no pedágio, você recebe um bilhete como esses de estacionamento de shoppings e continua normalmente pela estrada. Em algum momento, aparecerá outra praça onde você devolverá o bilhete e pagará com notas ou moedas, sem atendente, tudo em máquinas. “Não perca o bilhete, como o meu humano fez…“, diz o mascote-dedo-duro.
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  4. Muitos estacionamentos parecem gratuitos por não terem cancela nem funcionário algum. Mas, na verdade, são pagos. “Quer moleza? Senta na maria-mole”, tripudia o cão espertalhão…” Você deve achar a máquina de cobrança, pagar e colocar o tíquete em lugar visível sobre o painel, dentro do carro.
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  5. Os postos de combustíveis são todos no sistema self-service, como nos Estados Unidos. Você diz ao caixa quantos euros quer colocar e o número da bomba em que está seu carro. Depois, você mesmo opera a bomba.
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  6. Há poucos cachorros de rua na França, mas muitos andando com seus humanos. “A preferência é sempre deles!“, avisa Parmesolino.

GRANA… É o euro. Se você levar dólar, melhor trocar em Marselha, onde tem mais opções. O humano deixou pra trocar em Aix e se danou… Cidade pequena e turística = câmbio horrível“, diz o mascote economista.

A HORA E O DIA... A Provença está 5 horas à frente do fuso de Brasília.

BUROCRACIAS… Brasileiros não precisam de visto nem vacina para viagens de turismo, só de passaporte válido por pelo menos seis meses. Mas durante essa %$#% de pandemia da Covid-19, tá tudo alterado…, reclama o mascote. Por isso, verifique o site oficial de turismo da França: https://www.france.fr/en 

QUANDO EU VOU?… O mês de julho é quando os campos de lavanda adquirem aquela cor característica, típica dos cartões postais. “É também o começo do verão e dá pra ir na praia“, lembra o mascote metido a galã da areia. Mas os lugares ficam bastante lotados. Para os que preferem evitar o calor e as filas, o outono, de outubro a começo de dezembro, tem temperaturas agradáveis, e menos gente . Além de rolar a colheita da uva, diz o pinguço.

SURFA AÍ… 

CURIOSIDADE… Os franceses ADORAM catioros! Onde você vai tem vários! E coitados deles, que precisaram aguentar o humano enchendo o saco…


O quêêêêêêêêêêêêêêê???? Humano traíra!

Publicado por Paulo Mancha

Jornalista especializado em turismo, foi editor chefe da Revista Viajar pelo Mundo e repórter das revistas Terra e Próxima Viagem. Desde 2003, fez mais de 50 reportagens internacionais e, em 2012 e 2014, foi agraciado com o Prêmio de Melhor Reportagem da Comissão Europeia de Turismo. Comentarista esportivo do canal ESPN, Paulo decidiu unir neste blog as duas paixões: viagens e esportes.

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